Sou MaDame Lumière. Cinema é o meu Luxo.

Por Cristiane Costa Nem todo cineasta sabe tocar o dedo na ferida de uma maneira contundente, eficaz e com a maestria de uma direção...

O Clube (El Club), de Pablo Larraín



Por Cristiane Costa


Nem todo cineasta sabe tocar o dedo na ferida de uma maneira contundente, eficaz e com a maestria de uma direção que não tem a intenção apenas de cutucar uma instituição, um sistema ou individuo gratuitamente, mas expor uma construção narrativa que abre espaços para a contemplação crítica  e perguntas que não terão todas as respostas. Felizmente, Pablo Larraín é um destes diretores  raros e interessantes que elevam o Cinema Latino Americano a uma dimensão contemporânea, reflexiva e ativa e contribui para que o público observe bem a história e tire suas próprias conclusões. Adepto de temas polêmicos e com engajamento político e social, em "O Clube", ele chegou disposto a desenterrar os pecados da igreja católica e denunciar segredos, falsas posturas, dramas mal resolvidos e crimes pedófilos de sacerdotes. 






Selecionado como longa para representar o Chile na categoria de melhor filme estrangeiro no Oscar 2016 e forte candidato a emplacar a lista final do prêmio, a história retrata um grupo de padres que estão pagando penitência por seus pecados e abusos na igreja. Como prática de oração e expiação dos pecados, eles têm raríssimos contatos com o mundo externo e são supervisionados pela freira Monica (Antonia Zegers, esposa do diretor). É uma vida de desapego, isolamento e castigo. Após a chegada de um novo sacerdote e um trágico acontecimento, a sujeira começa a sair debaixo do tapete e os padres têm que enfrentar um iminente escândalo que coloca a reputação e os segredos deles em risco. Para evitar qualquer imagem negativa da igreja perante a comunidade, é enviado à casa o padre Garcia, jovem e belo, interpretado pelo ator Marcelo Alonso, com o qual os demais terão que lidar em intensos momentos de enfrentamento. Ao mesmo tempo, Sandokan (Roberto Farías), um homem estranho, traumatizado e problemático começa a incomodar os padres.  



Expor os pecados de sacerdotes não é um tema novo no Cinema pois até Pedro Almodovar em "Má Educação" já os expôs. Entretanto, o diferencial de Larraín é a direção e como ele executa o roteiro de uma maneira misteriosa e em crescente clima de tensão, suspense e desconfiança. Todos os aspectos técnicos como fotografia, som, montagem e atuações caminham para uma contínua revelação de um ambiente isolado e secreto, de pessoas inquietas e silenciadas pelos erros passados e que não são confiáveis. É como jogar o público em uma situação delicada como testemunhas dos segredinhos dos sacerdotes e, principalmente, em como eles não são perfeitos . Todos os seres humanos são pecadores e falhos, logo a dinâmica do filme é expor esta imperfeição humana de uma forma polêmica e brutal. Pouco a pouco, o longa cresce em densidade dramatúrgica até o clímax explosivo e cruel. 






A temática de Larraín parece repetitiva e mal resolvida para quem for reativo a críticas à igreja Católica ou estiver cansado deste tipo de abordagem em longas, no entanto, a experiência com o longa é perturbadora porque todos sabem que ocultar segredos e pessoas não resolve o problema dos crimes da humanidade, principalmente os ocorridos em contextos religiosos. Com um elenco masculino incrível, cada sacerdote expõe uma problematização e um histórico de vida. Do homossexual ao ex-militar, todos sofrem as mazelas de seus próprios pecados mundanos, de preconceitos com os quais têm que lidar, com a prisão psíquica imposta por seu próprio ofício. A igreja não deu a eles uma solução de vida e nem espaço para a reabilitação. Escondê-los em casas isoladas só reforça que eles são vergonha para a igreja e, por isso, o filme é tão contundente e controverso. 



O mal está ali preso a sete chaves e, nem mesmo a vinda de um jovem padre, representante da nova geração do sacerdócio, resolve os dramas dos demais. Por mais que esteja fazendo seu trabalho, ele ressalta padrões de conduta tradicionais já enraizados, não se relaciona bem com os colegas e se comporta com um policial. Desta forma, "O Clube" é um filme denso e corajoso que explora as nuances psicológicas desses personagens e deixa o público à vontade para analisar as complexidades de uma história de repressão e de condenação que, efetivamente, não cura as pessoas. Em suma, aqui há um clero doente.





Em constante clima obscuro e instigante, todos estes personagens são estranhos e duvidosos e isso faz parte do grande acerto do longa.  A todo o momento, a narrativa dá a impressão de que algo muito ruim e assustador irá acontecer com todos eles, assim, o clímax é um soco no estômago.  Elenco competente cuja atuação dá um tapa na cara da sociedade hipócrita e, em especial, na Chilena que, por tradição, é uma sociedade conservadora e que preza pela boa reputação. 






Ficha técnica do filme ImDB O Clube 
Distribuição: Imovision



0 comentários:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière